Cordas Têxteis: Histórico, Fibras e Tecnologia

Tempo de Leitura: 6 minutos

Desde os tempos pré-históricos as cordas tem sido empregadas pelo homem contribuindo com o desenvolvimento da humanidade. Hoje, com os grandes avanços das fibras sintéticas e tecnologias de fabricação, esse tipo de estrutura têxtil chega a substituir o aço em aplicações específicas.

Histórico de cordas

As cordas têm sido usadas para transmitir ou suportar cargas desde os primórdios da humanidade. As primeiras ‘cordas’ eram basicamente as trepadeiras naturais que eram usadas para ajudar a escalar árvores ou rochas para coletar, por exemplo frutas ou mel.  Posteriormente os seres humanos descobriram que podiam torcer as fibras encontradas na natureza obtendo fios e, em seguida, combina-los em formas maiores e mais fortes para produzir cordas capazes de suportar cargas significativas. Registros históricos de 700 aC mostram características de uma corda de 3 cabos sendo empregada para mover uma enorme estátua de um touro conforme Figura 1.

Figura 1: Detalhe de um touro sendo puxado por cordas
(700 aC)

Materiais empregados na produção de cordas

Tanto as fibras naturais quanto as químicas são usadas na obtenção de cordas. Até meados do século XX, as fibras vegetais eram predominantes para produção de cordas. Principalmente fibras de folha e caule (sisal, abacá, juta, canhâmo, entre outras) que são caracterizadas por uma resistência a tração relativamente alta quando comparado com a fibra de algodão por exemplo.

Hoje, com o advento das fibras sintéticas, o campo de aplicação das cordas se ampliou com melhoria associada ao desempenho e à tecnologia de fabricação. Embora amplamente substituída por fibras sintéticas, ainda há um uso substancial dessas fibras naturais. A Tabela 1 apresenta algumas fibras sintéticas que tem sido usadas em cordas têxteis e suas respectivas propriedades. 

Cordas produzidas a partir de fibras sintéticas têm várias propriedades que os tornam alternativas atraentes aos cabos metálicos por exemplo, como elevada resistência específica, não enferrujam, versatilidade para serem empregados em diferentes áreas entre outras. A título de curiosidade por exemplo o aço possui densidade em torno de 8 g/cm³  ao passo que muitas fibras sintéticas possuem densidade na faixa de 0,8 a 1,5 g/cm³. Isso significa que um comprimento mais curto de cabos de aço rompe sob seu próprio peso, o que torna cordas de fibras sintéticas de grande interesse para cabos de ancoragem em águas ultra profundas para plataformas de petróleo por exemplo. 

Tabela 1: Propriedades dos materiais empregados em cordas de fibras sintéticas.

Fibra Propriedades
Aramida (Kevlar ® , Twaron ® ):
Fibra de alto módulo
Longa cadeia de poliamida aromática sintética da qual pelo menos 5% das ligações amida estão anexadas diretamente para anéis aromáticos
Excelente relação resistência-peso
Alta resistência ao calor (carbonização a 426 °C)
Fluência insignificante
Baixa resistência à abrasão
Susceptível a fadiga de compressão axial
Copolímero (Olyfin, poliéster):
A combinação molecular de fibras de polipropileno / polietileno juntas com outras fibras como poliéster
Força / alongamento moderado
Peso baixo (flutuadores)
Boa resistência UV
Boa resistência à abrasão
HMPE (Plasma ® Spectra®, Dyneema® ):
Fibras de polietileno de ultra alta massa molecular produzido por gel-spinning (UHMWPE)
Alta relação resistência-peso
Muito boa resistência à abrasão
Excelente tenacidade dinâmica
Alongamento muito baixo (3–5%)
Bom desempenho de fadiga de flexão
Baixa resistência ao calor
Suscetíveis a fluência
LCP (Vectran®):
Fibra de alto módulo
Poliéster aromático produzido a partir de um cristal líquido termotrópico.
Excelente relação resistência-peso
Zero fluência
Excelente tenacidade dinâmica
Excelente desempenho de fadiga de flexão
Boa resistência à abrasão
Alta resistência ao calor (funde a 330 °C)
Poliamida (Nylon):
Uma fibra composta de macromoléculas que têm na cadeia principal ligações amida, das quais pelo menos 85% são ligadas unido a unidades alifáticas ou cicloalifáticas
Boa resistência-peso proporção
Boas características de absorção de choque
Alto alongamento (30-40%)
Boa resistência UV
Poliéster (Pet, Pen):
Inclui polímeros compostos de macromoléculas possuindo uma cadeia de pelo menos 85% em massa de um éster de diol e tereftálico ácido
Maior resistência aos raios ultravioleta de qualquer fibra
Boa resistência à abrasão
Boa resistência-peso proporção
Alongamento moderado (15–20%)
Poliolefina (PE, PP):
Uma classe de polímeros formado em sua cadeia por pelo menos 85% em peso de eteno (etileno), propano (propileno) ou outras unidades de olefina
Baixo peso
Baixo custo
Boa fibra de uso geral

Tipos de cordas

A estrutura de uma corda começa empregando uma unidade básica um fio têxtil. Sua composição e título definem o ponto de partida de qualquer corda. Vários fios torcidos, ou trançados juntos serão combinados para formar um conjunto com configuração coesa, compactas e flexíveis, geralmente para produzir uma resistência à ruptura e extensibilidade selecionadas com um quantidade mínima de fios. Um exemplo de uma corda tradicional (3 pernas) é apresentado na Figura 2. Na maioria das construções de uma corda, uma série de fios simples são torcidos e posteriormente retorcidos em sentido de torções opostas a fim de obter conjuntos maiores e formar cabos, pernas e a corda propriamente dita. Denomina-se nesse caso uma corda estruturada, ou seja somente essa combinação de torções promove a coesão necessária para aplicação requerida.

Figura 2: Exemplo de uma tradicional corda 3 pernas e suas respectivas partes.

De modo geral as cordas podem ser classificadas em duas categorias: 

A) Torções combinadas e trançadas 

Com ângulos de torção ou de trança elevados, estas são as  estruturas mais comuns para multiuso em geral. Encontradas em indústrias, aplicações náuticas, esportes, e serviços de utilidade geral. Cobrem uma gama de aplicações, desde pequenos cordões usados para amarrar pacotes, até grandes cordas de amarração de petroleiros, dentre outras aplicações. Na Figura 03 são mostrados um exemplo de corda de torção combinada (3 pernas) e trançadas 8 pernas.

Figura 3: Exemplo de cordas formadas por: (a) combinação de torções (3 pernas) e (b) trançadas (8 pernas)

Com essas configurações de cordas (torção combinada e trançada) é possível obter diversas variações aumentando o número de pernas empregadas. Alguns exemplos comuns são: 

  • Torção combinada (3, 4 e 8 pernas), 
  • Trança simples ( 8 e 12 pernas)
  • Trança dupla (trança na trança)
  • Trança solida (paralela)

B) Cordas não estruturadas

Por outro lado, em alguns casos visando atender uma demanda específica, algumas cordas utilizam uma baixa torção (ângulos hélicoidais muito pequenos), o que se denomina cordas não estruturadas. Nesse caso, haverá necessidade de utilizar capas trançadas (para conter os elementos formadores da corda) que podem ou não apresentar função estrutural como pode ser visto na Figura 4. Um exemplo são cordas empregadas na amarração de plataformas flutuantes petrolíferas (comumente chamado de cabos de ancoragem), onde cada corda chega a apresentar cargas mínima de ruptura superiores a 2000 toneladas.

Figura 4: Cordas não estruturada (repare que cada perna é uma subcorda de torção combinada (3 pernas) posicionada paralelamente uma das outras

Exemplos de aplicações para cordas não estruturadas são:  cordas de amarração para astronautas, sustentação de altos mastros de embarcações a vela, cordas de salvamento, cabos de ancoragem para plataformas flutuantes de energia eólica entre outros.

Com essas configurações de cordas não estruturadas também são obtidas diferentes variações, como:

  • Trançadas com capas
  • Cordão paralelo, encamisado
  • Fios paralelos com capas trançadas ou extrudadas
  • Com núcleo ou revestimento externo em cabos de aço.

 De modo geral existem grandes variações dentro de cada tipo da estrutura da corda. A aparência e a funcionalidade de uma dada estrutura são influenciadas por vários fatores como:

  • Composição e título dos fios
  •  Quantidade de torção em cada estágio de produção 
  • Tamanho e número de subcomponentes em cada estágio de produção
  • Tensão nos subcomponentes durante a produção 
  • Temperatura de termofixação e outros acabamentos (finishing)

 

Na atualidade diversas cordoarias individuais desenvolveram sua própria tecnologia e projetos de fabricação de cordas, adequando a disponibilidade de máquinas de produção as necessidades dos clientes. Isso torna a tecnologia da fabricação de cordas, um nicho de conhecimento bem específico. 

Dessa forma a fabricação de cordas são ajustadas para se adequarem a produção desejada, mas no geral, para cordas de uso geral com bom desempenho, a gama de variações de design dentro de qualquer tipo de construção é pequena. Ocasionalmente, um fabricante de cordas pode alterar o design consideravelmente das versões mais comum para atender a uma necessidade específica. 

De modo geral, os avanços que tem sido alcancado no desenvolvimento de novas fibras sintéticas juntamente com os diferentes  tipos de construções de cordas tem tornado possível a utilização dessas estruturas em uma vasta gama de aplicacões na atualidade. Contribuindo com o desenvolvimento desde as aplicações mais simples até as muito específicas em diferentes áreas. 

Referências

Handbook of fibre rope technology. A. McKenna, J. W. S. Hearle and N. O’Hear. Published by Woodhead Publishing 2004

Advances in Braiding Technology Specialized Techniques and Applications. Yordan Kyosev. Published by Woodhead Publishing series in textiles 2016

Textile rope -A review. Chattopadhyay. Indian Journal of Fibre & Textile Research 1997

Joziel Cruz

Engenheiro Têxtil – UTFPR

Doutorando Engenharia de Materiais – UFRGS

Professor substituto DET-UFSC

Compósitos / Balística / Cordas / Têxteis

Teremos o maior prazer em ouvir seus pensamentos

Deixe aqui seu comentário

Mostrar
Esconder
Weavinn Blog
Logo