Formando Engenheiros têxteis: os desafios do ensino superior na área têxtil

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Minha história no têxtil. Onde tudo começou

Quando fiz o vestibular para o curso de Engenharia Têxtil da Universidade Estadual de Maringá, em 1997, tive que me basear em informações apresentadas pelo Guia do Estudante, versão impressa, comprado em banca de revistas. Me lembro de não ter uma clareza específica sobre a atuação do profissional na época. Mas me pareceu algo bom: era uma engenharia e contemplava setores da moda, que sempre gostei! Baixa concorrência, muitas indústrias têxteis. Tive a certeza que faria aquele curso.

E assim foi. Ingressei em 1998 com uma turma de jovens calouros, curiosos e sem saber exatamente o que nos aguardaria, mas com o passar dos anos, tudo foi sendo revelado e a paixão pelo setor foi nascendo. Como todo curso de Engenharia, tivemos que atravessar aqueles dois primeiros anos sofridos de muito cálculo, física e química, mas depois, muitas disciplinas específicas. 

Durante o curso pude estagiar em uma fiação de algodão. O primeiro contato efetivo com a prática. Ao me formar, fiz o estágio obrigatório em uma fiação de sintéticos, cuja produção se baseava em fios LOY, POY e FDY. Eu me encontrei como profissional e ali tive a certeza que seguiria a carreira. Infelizmente a empresa foi vendida na época e não foi possível permanecer. Segui para uma fiação de algodão e mistos, no interior do Paraná. O processo já era conhecido e tive que desenvolver habilidades de gestão, liderança e ótimo senso. Lidar com tantas pessoas em uma fábrica que rodava 24 horas por dia, 7 dias da semana não era uma tarefa fácil para uma jovem de 23 anos. 

Ao longo dos anos eu percebi o quanto gostava de ensinar. E de aprender. Consegui um emprego como docente no curso de Design de Moda de uma instituição privada. Ensinava tecnologia têxtil. O feedback dos alunos era excelente e eu me sentia realizada ensinando para turmas de 45 alunos cada. Um dos meus alunos um dia me disse ser o coordenador da Pós Graduação em Engenharia Urbana e me motivou a fazer a prova para o mestrado neste curso. Fiz. Passei em primeiro lugar, consegui uma bolsa de mestrado e ali comecei a me dedicar à pesquisa. Deixei o curso de Design de Moda e paralelamente estudava para o concurso público da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, onde fui aprovada e trabalho desde 2012.

Em 2013 ingressei no doutorado em química, também na Universidade Estadual de Maringá, onde iniciei estudos sobre o uso de resíduos têxteis para produzir carvão ativado e utilizar esse material para remoção de corantes de efluentes têxteis. Ainda no doutorado pude cumprir um ano nos EUA (o chamado doutorado sanduíche) e voltei às atividades na Universidade, compartilhando o conhecimento através de orientações em programas de Iniciação Científica, Trabalhos de Conclusão de curso, entre outras tantas possibilidades.

Os desafios no ensino superior

Hoje há 04 instituições no Brasil que ofertam vagas para o curso de Engenharia Têxtil. Universidade Tecnológica Federal do Paraná (Campus Apucarana), Universidade Estadual de Maringá (Campus Goioerê), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Natal) e Universidade Federal de Santa Catarina (Blumenau). É possível ingressar nesses cursos via vestibular e via Sisu (Sistema de seleção unificada). Para se inscrever no Sisu é obrigatório ter feito o Enem (exame nacional do ensino médio). Na UTFPR, o ingresso é somente via Sisu. A nota exigida para ingressar no curso de Engenharia Têxtil é baixa quando comparada às notas para ingressar nas Engenharias clássicas, como civil, elétrica e química. Mesmo assim, temos enfrentado dificuldades para atrair alunos para o curso e até mesmo para mantê-los. Muitos alunos usam o curso como “trampolim” para outros tipos de Engenharia, mais conhecidos.

Com esse baixo índice de procura e alto índice de evasão, vários trabalhos são feitos para entender a causa da baixa procura e das desistências. Os cursos de Engenharia por si só perdem alunos ao longo dos anos em virtude das disciplinas básicas como cálculo, física, química, entre outros. Muitos alunos ingressam no ensino superior com deficiência nessas áreas e como ter um bom desempenho em disciplinas avançadas possuindo dificuldades no conteúdo básico? Então, os dois primeiros anos são bastante desafiadores para acadêmicos e professores. Ao mesmo tempo, os estudantes começam a se questionar sobre a atuação do Engenheiro Têxtil no mercado de trabalho. Pensando nisso, organizamos eventos como o “Fórum de egressos”, onde os alunos já formados descrevem suas atividades e locais de trabalho. 

Mostrar que o curso é promissor é algo fácil, pois temos mais de 95% de empregabilidade. Temos um curso que atende a segunda maior indústria de transformação do país. Os formados estão hoje bem colocados e são grandes incentivadores do curso. 

Além das razões acima apresentadas para os índices de desistência dos cursos, enfrentamos o alto número de instituições privadas, que embora indiretamente, são concorrentes devido à localização geográfica, flexibilidade de horários de aulas e avaliações. 

Manter a motivação dos alunos durante os cinco anos de curso é hoje outro desafio. O mundo passa por uma crise econômica e as instituições públicas não são “autossustentáveis” e dependem da verba dos governos federais, estaduais e até mesmo municipais, pois o entorno das universidades pode ser um atrativo a mais para a decisão do aluno de ali se graduar. As pesquisas são realizadas na medida do possível e muitos alunos não têm condições financeiras para se manter na Universidade sem o respaldo de auxílios financeiros, hoje limitados.

Mesmo com todo o cenário sendo desafiador, temos excelentes resultados. Focando nos alunos formados que decidiram seguir no setor têxtil, temos várias razões para seguir lutando para manter os cursos de Engenharia Têxtil em funcionamento. 

O setor têxtil atende a uma das necessidades básicas do ser humano, que é se vestir! Todos precisam de vestimentas, roupas de cama, mesa, banho. Os outros setores como têxteis técnicos, higiene pessoal, médico-hospitalares, alto desempenho, geotêxteis, automotivos, entre outros, embora muitas vezes desconhecidos de grande parte da população, são o suporte para um cotidiano funcional e eficiente.

Precisamos do apoio das associações de classe e dos órgãos governamentais para popularizar o setor têxtil. As pessoas precisam conhecer o significado dessa palavra: Têxtil. Precisam reconhecer sua importância. Precisam valorizar essa cadeia, com elos tão fortes. Hoje as informações são dissipadas com muita rapidez e todos podem ter acesso a todo tipo de informação.

Temos que alcançar a população de alguma forma e mostrar que o curso de Engenharia têxtil vale a pena! O setor possui grande participação no PIB do país. Temos que fornecer mão de obra especializada para as indústrias têxteis, para os canais de comercialização e também formar empreendedores.

Hoje as quatro instituições entenderam que precisam trabalhar juntas e alinhar o currículo dos acadêmicos. Assim, poderemos fomentar o intercâmbio de acadêmicos e docentes entre as instituições, divulgar o curso e todos os dados para as empresas e para a população. Precisamos do apoio de todos para continuar formando Engenheiros Têxteis, mas acima de tudo, cidadãos conscientes de seu papel na sociedade.

Teremos o maior prazer em ouvir seus pensamentos

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